segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Você tem bom aproveitamento no Gestar?

O Gestar é um curso em que você só terá sucesso efetivo se ler muito em casa.

Compare o número de horas presenciais (80 horas) com o total do certificado (300 horas).

O material é excelente? Então é preciso usá-lo.

É preciso ler, colega.

Sabemos que há atividades para ser planejadas e postas em prática na escola; há um portfolio a montar, mas não faça nada disso sem fundamentação. Não faça só pelo certificado. Alimente seu desejo pelo sucesso pedagógico, o desejo de levar seus alunos à condição de leitores e escritores.

Esse alimento está no estudo.

Em nosso encontros, apresente seus questionamentos sobre a prática, fundamentados com uma teoria.

Leia!

No dia 22 de agosto, estudaremos as unidades de 15 a 18. São quatro temas: O que levar em consideração no momento de estudar um texto na escola? Que crenças e teorias estão por trás de nossa prática de produção de textos? Como permitir que nosso aluno construa seu próprio estilo? Como orientar a coerência de seus textos?

São 194 páginas para nos ajudar a compreender melhor nosso fazer. Não as despreze.

Organize seu tempo e vá aos encontros disposto a dar sua contribuição para a aprendizagem de todo o grupo. Você verá, ao final, que ganhou muito mais do que deu.

Várias formas de falar

Variedades linguísticas diversas na fala de uma só pessoa em um mesmo momento.

No vídeo "Violentamente pacífico", MC Léo Carlos posiciona-se de forma contundente ante as injustiças sociais, de que ele próprio é vítima.

Entretanto, não é por isso que este vídeo está aqui.

Num espaço privilegiado de professores, é, no mínimo, surpreendente a forma com que ele usa a Língua Portuguesa.

É verdade que muitos de nós aprendemos a variedade padrão na escola e passamos a vida usando ora nossa “variedade materna”, ora a língua da escola.

Mas em que situações usamos as duas, ao mesmo tempo? E mais de duas?

Léo Carlos faz uso de termos como “Letal”, “os guetos de Varsóvia”, “acessibilidade”, faz uso do subjuntivo plural, como “invertêssemos” e “que sejamos”, e junto com tudo isso emprega a gíria “trampo”, chama seu interlocutor de “velho”, de “brother”, além de usar a concordância mais comum neste país: “os cara que te força”.

É uma escolha agir assim? Seria o caso de querer ficar bem com quem tem poder, sem dar as costas a sua comunidade?

domingo, 2 de agosto de 2009

Narradores de Javé: uma fábula que vai ao fundo da memória genuína e brasileira.

Como todo grande filme, Narradores de Javé nos envolve numa trama bonita, poética e irreverente. E traz assuntos polêmicos, atuais e dignos de serem discutidos.

Alguns clichês do cinema brasileiro como filmar o Nordeste, fazer cenário em uma pequena cidade com seus tipos e tratar da desigualdade social são alguns aspectos presentes nesse filme. Mas, são trabalhados de maneira inteligente, irônica e, ao mesmo tempo, sutil e encantadora. Poderia caracterizar Narradores de Javé como sendo um filme espetacular. Só mesmo assistindo para saber.

É o que se pode imaginar desde o apresentar dos créditos iniciais são: uma vírgula imperadora e camaleônica surge na tela e uma trilha musical irreverente dá seu ar e graça.Logo, a vírgula teimosa vai virando os dois pontos já conhecidos, sobretudo pelos escolarizados. Depois vem um ponto final floral que, nos trejeitos melódicos, nos nomes inaugurando-se na tela e no olhar festivo do espectador vira ideograma japonês vermelho e babilônico. Surgem então outros nomes e reticências dinâmicas, como bolas de bilhar se alternando, parecem anunciar o que virá: um jogo do destino feito de histórias pinceladas de nossa própria vida que nos une e nos congrega silenciosamente.

Tudo começa, nesse jogo destinado a espectadores felizes, com um personagem vivente e anônimo, que perde um barco e sua viagem. E nessa parada da vida, nessa perda, nesse novo lance, fica à margem de outra viagem, outro jogo a ser vivido: a Saga dos Narradores de Javé.
Nesse ponto de espera uma das frases ditas por um dos personagens -eu mesmo, que não sou das letras vou contar um causo e acho que vocês não vão querer ouvir- inicia a nova viagem: embarcamos todos na trama do filme, mergulhamos nos tempos: o atual, o passado e o imaginário. E nas vidas distintas dos personagens, os moradores de Javé, vilarejo encravado no sertão nordestino, um povoado que parece ainda se situar na Idade Média em tempos de globalização e modernidade.

E na espera do outro barco, do novo dia, vamos revivendo a história desse lugarejo em múltiplos flasbacks que revisitam os íntimos de seus acontecimentos, bordadas pelos depoimentos das memórias de seus moradores. Ficamos orgulhosos de usufruir o trabalho dos atores nas suas mais singelas representações.

Javé, lugar iluminado pelas lembranças e relatos, pelos testemunhos e vivências vê-se subitamente carente de importância, pois seus moradores se apercebem que a riqueza de suas histórias foi esquecida pelo oficial e pelas letras. Pior: prestes a sucumbir, se vêem ameaçados de verem a igreja e seu campanário desaparecerem sob as águas avassaladoras pretendidas pelo progresso tão imperativo e desalmado, na forma de uma represa em e de uma usina hidrelétrica na região.

Assim, sem tábua de salvação, resolvem lutar para impedir o que está por acontecer. Do contar e recontar os causos da história do vilarejo e do resgate dos feitos dos antepassados eles organizam uma ação possível para dar importância ao lugar. E, sobretudo impedir que um lugarejo como aquele desaparecesse sem deixar nenhum rastro, vestígio ou comprovante de vida ilustre.
Nesse contexto é que entra em cena o personagem Antonio Biá, o carteiro da agência de correios de Javé. Fora rechaçado e tripudiado por todos do vilarejo pelo fato de ter escrito e enviado cartas com histórias mais ou menos inventadas a partir da vida dos moradores, movimentando assim a sede dos correios de Javé que estaria fadada à extinção, por conta da ausência de moradores alfabetizados.

Mediante a nova situação de desespero geral, com a estratégia de contar e escrever o oficial e científico como única perspectiva de salvarem a vida do lugar, Biá passa a ter o poder de escrivão.

Como salvar uma terra apalavrada? Como consignar valor à divisa cantada, da posse de terras passadas de pai para filhos sem o oficial dos cartórios, dos carimbos, dos datados e assinados?
Desse dilema nascem e renascem as diferentes versões das tantas lembranças, vivências e percepções presentes nos relatos dos personagens: a odisséia de Javé.

No emaranhado entre a ficção e a realidade vai se construindo a trama do filme, rica em sensações, paisagens, palavras, imagens, tons e cores da linguagem brasileira. Vai se desenhando o projeto de resgate histórico, através do registro das memórias dos seus moradores, os narradores de Javé.

Da colheita dessa narrativa vivida, lembrada, cantada e falada nascerá o livro da salvação? Vivemos todos os momentos tragicômicos no escurinho do cinema com as nossas maiores esperanças.

Eliane Caffé, a diretora do filme e seu elenco ímpar (José Dumont, Nelson Dantas, Nélson Xavier, Rui Resende, Gero Camilo dentre tantos), nos trazem, com criatividade e sutileza, momentos prazerosos de diversão, cultura, arte e alguns elementos importantes para a nossa reflexão: a questão do progresso, da memória e da relação entre oralidade e escrita. Um ponto alto que nos toca no silêncio da emoção é a importância dos indivíduos na História e o valor da memória na vida de um povo.

Há muitos méritos no trabalho da equipe que realizou o filme. Sabemos que Javé, na realidade é Gameleira, cidadezinha baiana, com cerca de 2000 habitantes e que, pelo menos até a época da filmagem, não sabia o que era coleta de lixo. Sabemos que muitos desses habitantes são figurantes e atores do filme.E que se adentraram com a mais absoluta pureza no processo criativo, juntamente com os atores profissionais, que puderam nesse compartilhamento consignar leveza e frescor na verdade de cada um dos personagens.Sabemos também que o roteiro original foi construído com base nos relatos colhidos em territórios brasileiros, mais precisamente no interior mineiro e baiano: as chamadas expedições da memória.

Outros aspectos importantes podem ser destacados nesse filme, depois de nos aventurarmos de corpo e alma e sexto sentido nesse drama encantador.

Um deles, que me foi caro no papel de espectador e educador, diz respeito ao valor e a importância que se dá ao que é escrito em detrimento ao que é falado. No desenrolar do filme também vamos nos apercebendo de uma outra questão importante: a interferência do narrador na história. Nos é demonstrado que existe uma história oficial (a dos livros escolares ou oficiais) e a história dos excluídos.Sabemos que uma história escrita num livro pode ser diferente da história verdadeira, pois é contada sob a ótica de quem a escreve ou narra. É como diz Biá num dos momentos de oficializar o que foi cantado e falado por tantas vozes e tempos: uma coisa é o fato ocorrido, outra coisa é o fato escrito. Ao escrever ou narrar um fato, o autor insere nele suas próprias emoções e interpretações, seus sentimentos e experiências de vida, inventa dados e floreia fatos, pois, de acordo com o famoso ditado popular, quem conta um conto aumenta um ponto.

Ficamos nos perguntando se, com o resgate da memória coletiva, através da memória individual, o Vale de Javé ficará livre de seu destino de ser coberto pelas águas do rio. Ou seja, se a estratégia inusitada de escrever um dossiê que documente os "grandes" e "nobres" acontecimentos da história do povoado justificaria a sua preservação. É que na construção deste dossiê o que ocorre é um duelo poético entre os contadores que disputam com suas versões históricas, fantásticas ou lendárias, o direito de configurarem o patrimônio de Javé.

Narradores de Javé é um filme completamente marcado pela memória, uma memória mítica, produzida pela fala, pela narração. Uma memória dinâmica que suscita o jogo da memória coletiva com a individual, do passado com o presente e o futuro, mostrando a importância da relação entre eles.

Um outro aspecto interessante no filme é a relação entre oralidade e escrita. Vale do Javé é uma comunidade essencialmente oral. A divisão e a apropriação de terras, por exemplo, eram cantadas, ou seja, era o canto que legitimava sua posse e não um documento oficial.
Outra questão abordada pelo filme tem a ver com a destruição e os problemas causados pelo progresso. No caso, a destruição de um grupo, da memória e da cultura de um povo. E isso nos faz refletir sobre a desigualdade social em nosso país, já que a narrativa de Javé reproduz a história de um dos tantos grupos oprimidos.

Ainda mais um aspecto interessante do filme é a variedade linguística do Português. O modo de falar dos personagens, as expressões utilizadas por eles, evidenciam as variações dialetais e as variações de registro que revelam todo um conjunto de informações sobre os personagens e nos envolvem e nos fazem identificar com o mundo vivido por eles.

Uma coisa é coisa acontecida. Outra é coisa escrita. O escrito melhora o acontecido. Com mais este dizer de Biá podemos perceber o papel e o poder que lhe é outorgado, na medida em que passa a ser o escritor. Fiquei pensando, agora que escrevo sobre o filme, no poder que se abre a um memorialista, por exemplo, quando ouve as palavras do personagem e entrevistado e cria, no seu escrito, o que chamamos de memórias literárias: um misto e amalgamado de realidade e ficção que se forjam numa só linha e entrelinha, para dar sentido, significância e beleza.

Poderíamos nos perguntar, diante de quaisquer versões apresentadas de um único fato ou história: qual delas é a que vale? Mais ainda: qual das culturas é a melhor? Em qual das religiões Deus é mais verdadeiro?

Penso eu que sempre nos deparamos com uma situação similar à dos narradores de Javé, tentado salvar o que somos, destacar a nossa glória e a nossa luta frente ao que nos é valoroso. Sempre estamos tentando salvar o sino que brada a nossa voz e guarda simbolicamente as marcas da História para ser novamente inaugurado em um novo lugar.
(Antonio Gil Neto)

[Publicado em: 23/07/2009, no blog da Comunidade Virtual Escrevendo o Futuro (Olimpíadas de Língua Portuguesa) http://escrevendo.cenpec.org.br]

Preparando-se para 22 de agosto

No próximo encontro, 22/08, estudaremos as unidades de 15 a 18.

A tarefa que ficou para casa foi a elaboração de perguntas para um dos seguintes textos do TP 4: Baião (p. 42), Você lembra, pai? (p. 48), Herança africana (p. 49),Nossas cidades (p. 76) e Cidadezinha qualquer (p. 97).

Que tipo de perguntas?

O estudo da unidade 15 deve nos orientar quanto a isso.

Além dessa tarefa, é preciso pôr em prática uma das atividades propostas pelos TPs (Avançando na prática).

Devemos sempre escolher uma atividade para cada par de unidades.

Então, como já estudamos as unidades 9 e 10, 11 e 12, 13 e 14, cada cursista já deve ter realizado três sugestões com suas turmas.

Ânimo, amigos!

Sob a luz de Érico Verissimo

A vida sempre foi difícil, porque seu outro lado é a morte. Sempre houve a luta do bem contra o mal. Parodiando Érico Verissimo, é nosso papel, como educadores, manter acesa nossa luz, para que as pessoas que convivem conosco possam enxergar a diferença entre mal e bem, entre morte e vida, e fazer a escolha certa.
(Professora Elisa Alves)

"Tem-me animado até hoje a ideia de que o menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades é acender sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Se não tivermos lâmpada elétrica, acendamos nosso toco de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não desertamos nosso posto" (Érico Verissimo).

sábado, 1 de agosto de 2009

O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO

É tempo de cada um se ver como o operário que é.
Como educadores que somos, temos muito a construir.
“Coisas, objetos, produtos, manufaturas”?
Pessoas.

E, sim, deixamos em cada uma delas a marca de nossa mão.
Que não seja uma marca negativa.
Que não seja uma marca ao acaso.
Que seja uma marca digna das vidas que se constroem ao nosso redor.
E que nos marque de volta, e nos retroalimente e nos faça construtores também de nós mesmos.
(Professora Elisa Alves)


O OPERÁRIO EM CONSTRUÇÃO
Vinícius de Moraes


E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe
num momento de tempo todos os reinos do mundo.
E disse-lhe o Diabo: - Dar-te-ei todo este poder e a sua glória,
porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero;
portanto, se tu me adorares, tudo será teu.
E Jesus, respondendo, disse-lhe:
- Vai-te Satanás; porque está escrito:
adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás.
Lucas, cap. V, vers. 5-8



Era ele que erguia casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.

Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
- Garrafa, prato, facão -
Era ele quem os fazia
Ele, um humilde operário,
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
- Exercer a profissão -
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.

E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:

Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.

Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação.
- “Convençam-no” do contrário -
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.

Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu, por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!

Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão.
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.

Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
- Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.

Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas.
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca de sua mão.
E o operário disse: Não!

“Loucura!” - gritou o patrão
“Não vês o que te dou eu?”
“Mentira!”- disse o operário
“Não podes dar-me o que é meu.”

E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Com o medo em solidão.

Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção